Marcia Coelho
Psicóloga, especialista em neuropsicologia, desenvolvimento Humano e Consteladora Familiar Sistêmica. Sou ex companheira, Mãe de 2 filhos, avó de 3 lindos netos, filha, neta, irmã e amiga. Amante da vida e de tudo que ela me traz, mesmo as dificuldades da vida. Foi com elas que amadureci e cheguei até aqui. Isso não significa que estou 100% realizada, a vida é feita de altos e baixos e vou continuar a buscar o que me faz bem.
Sempre ouvi das pessoas, você é uma guerreira, exemplo e inspiração de vida.
Pois bem agora estou aceitando esse lugar e vou colocar em prática tudo que puder para mostrar as pessoas e a sociedade como é ser uma pessoa com deficiência física. Aos 3 anos de idade tive poliomielite (paralisia infantil) e em consequência disso tenho uma sequela e uma deficiência física. Minha capacidade muscular é reduzida e faço uso de duas muletas canadenses. Mas só percebo essa deficiência quando encontro na sociedade barreiras que me impedem de realizar algo que necessito. Nesses momentos me pergunto, se essas barreiras não existissem, não haveria deficiência? Então, a deficiência é uma questão relacional? Se você não sabe calcular de cabeça, você usa uma calculadora? Assim você não se percebe incapacitado. Mas diante da não existência da calculadora sua incapacidade vai ficar em evidência, não é mesmo? Entendeu? é assim que uma pessoa com deficiência percebe sua incapacidade na sociedade.
Para me manter ativa e disposta pratico atividade física todos os dias, pilates, musculação, natação e biodança.
Tudo na minha vida aconteceu mais tarde e com muita dificuldade. Minha família sempre teve pouco recurso financeiro. Aos meus 9 anos da idade minha mãe fez uma rifa e o seu gerente descobriu, comprou todos os números e completou o que faltava para comprar uma cadeira de rodas, foi minha primeira autônomia o direito de ir e vir. Aos 11 anos de idade recebi minha primeira muleta de madeira, facilitou a minha mobilidade. No início da adolescência vieram as muletas canadenses, foi uma mudança difícil de adaptação, não queria mudar de muletas.
Na idade de ir pro mercado de trabalho aos 17/18 anos foi complicado, mesmo capacitada com cursos exigidos da época (curso de datilografia, telefonista e telegrafista). Buscava por anúncios correspondentes dentro minha capacidade laboral. Foram muitas recusas, muitas mesmo, era um tempo que a aparência física e beleza era um requisito muito forte. Eu era bonita, mas com deficiência física e fazendo uso de muletas, isso não preenchia os requisitos dos anúncios, não falavam abertamente, mas eu entendia a linguagem oculta dos empregadores.
Depois de bater em muitas portas, ser rejeitada várias vezes e já desanimada, imaginava não conseguir um trabalho. Até que uma pessoa muito querida, minha tia que trabalhava no do serviço público e conhecia muita gente se prontificou. Contactou um conhecido da prefeitura e assim fez a ponte, acreditando na minha capacidade laboral. Fui contratada e colocada à disposição do serviço Judiciário e lá fiquei 17 anos, nesse interim fiz concurso público municipal e continuei assim trabalhando no judiciário,
sempre com uma jornada semanal de 30 horas.
Após ser mãe solo, pedi transferência para estar mais perto de casa e do meu filho, fui para o setor de transporte e permaneci lá por 2 anos.
Nessa época engravidei de novo, tive minha filha com meu companheiro, fiquei de licença maternidade e progorrei por mais um ano sem proventos, para cuidar mais atentamente das crianças. Quando retornei pedi novamente transferência, como o meu concurso era administrativo, tinha essa liberdade, fui para a secretaria de saúde e colocada no setor de quimioterapia, fiquei lá 3 anos foi uma experiência muito forte, sobretudo com as crianças em tratamento de câncer, tinha dois filhos e isso mexia comigo e lá que decidi cursar Psicologia. Na Secretaria da Saúde fiquei 3 anos, saí de licença novamente por mais um ano, pois estava cansativo demais, estudar, cuidar da casa e filhos e ainda trabalhar. Quando retornei fui lotada na Secretaria da Educação no setor de Educação especial onde se atende crianças de diversas deficiências, me senti literalmente em casa.
e fiquei lá até me aposentar ou pagar para me aposentar.
Trabalhava 6 horas, estudava 4 horas, era mãe de 2 crianças, esposa e dona de casa, ufa foi bem trabalhoso, mas também prazeroso, era jovem e dava conta, também tinha um companheiro bem ativo em tudo e a ajuda de uma colaboradora. Recebi bolsa de estudo da prefeitura de 60% o que foi muito importante, pois meu salário não era suficiente. Após formada além do serviço administrativo na educação especial, Trabalhei como avaliadora (adc) forense na Vara da Família (contrato por trabalho). Era voluntária e psicóloga do Projeto Paradesporto, tinha um grupo de mulheres com deficiência e fazia psicóloga clínica. E junto a uma equipe de Pessoas com Deficiência fui convidada a fazer parte de um grupo. Nesse grupo nos reuníamos para discutir e articular a implementação de Conselho Municipal dos Direitos da Pessoa com Deficiência em Blumenau. Posteriormente fui a coordenadora desse conselho por um ano onde estive em Brasília no Congresso Nacional dos Direitos Humanos e da Pessoa com Deficiência, foi uma experiência maravilhosa e de muitos saberes.
Minha aposentadoria
Quando foi promulgada a Lei brasileira de inclusão N. 13.146 de julho de 2015 para assegurar e promover condições e igualdade do exercício dos direitos e das liberdades fundamentais para a pessoa com deficiência, visando a inclusão social e cidadania, percebi que tinha direito a me aposentar, tinha contribuição suficiente. Conforme a lei de aposentadoria, Homem com deficiência se aposentam com 25 anos e Mulher com 20 anos de contribuição. No meu caso já tinha 23 anos. Entrei com o pedido de aposentadoria na prefeitura e foi negado, justificando a não regulamentação da União perante aos municípios. Paguei um advogado e ajuizamos uma ação para tentar via judicial. Aguardei uns 3 anos e o processo também foi negado pela mesma justificativa, a não regulamentação da União Federal. Foi bem difícil aceitar e acreditar que isso estava acontecendo comigo.
Foi quando quebrei o fêmur numa queda e fiquei afastada do trabalho quase 1 ano, tive depressão, me sentia impotente e triste. Recebi alta do médico perito para voltar ao trabalho, mesmo sem condições psicológicas e ainda sentindo dores na perna. Recebi a proposta da médica para me aposentar por invalidez, obvio que não aceitei pois, sabia que iria me curar e ainda teria prazer em trabalhar como psicóloga. Foi quando decidi...
Vender meu carro e pagar o tempo que faltava: 2 anos e meio para completar 30 anos de trabalho, na época investi 27 mil reais, muitos acharam loucura, mas eu não via outra opção. Queria me afastar do que me causava sofrimento psicológico e a injustiça de não ter meu direito garantido, mesmo com uma lei dizendo que podia. Isso é um resumo da minha trajetória de vida profissional. Fiz muita terapia para superar minhas tristezas e angústias. Hoje aposentada do serviço público, mas, muito ativa como psicóloga e Consteladora Familiar Sistêmica.





